Parece-me que o João está a entrar no mundo dos sentimentos. Eu às vezes fazia-lhe cara feia quando ele começava a fazer birras, dizia-lhe "não faças isso que a mãe fica triste", mas ele nada. Depois, quando lhe ralhava por ter feito alguma asneira, começou a fazer carinha de arrependido e a dizer "obiaca" (obrigada) em vez de "desculpa". Passados uns tempos, quando não o deixava fazer determinada coisa e ele insistia, eu punha a cara nº 31, ele desistia, mas continuava a chorar e perguntava "o que foi mãe?", como quem diz "porque é que te zangaste, não te zangues, eu não fiz nada".
Até ontem: estava a dar um episódio do Pocoyo e o Pocoyo estava triste, o senhor que faz a voz off do Pocoyo até comentou "Oh, estás triste, Pocoyo" e o João constatou "o Pocoyo tá tiste". Respondi-lhe que sim, mas que já ia passar, o Pocoyo já ia resolver o problema (já não me lembro qual era, mas acho que foi porque a orquestra das bolas se pirou). Nunca me debrucei sobre o assunto, não sei o que se deve dizer nestas situações, mas hão-de aparecer-me casos bem mais bicudos e inesperados e não me resta senão fazer o melhor que sei. E o que sei é que prefiro assim a fazer de conta que não percebi ou a dizer "não, o Pocoyo não está triste". Julguei que o caso tivesse ficado encerrado e não pensei mais no assunto, mas hoje, depois de chegarmos a casa, ele veio ter comigo e disse "o João tá tiste". Eu pensei "oh valha-me Deus", perguntei porquê, ele não respondeu, imaginei que quisesse brincar.
À noite, ao telefone com a minha tia, contava-lhe eu alguns episódios do miúdo e ele voltou, com mais veemência: "O João tá tiste" - e cruza os braços e franze a cara de zangado e amuado ao mesmo tempo. Começo a perceber quando me diziam que depois, quando eles crescem, é que dão trabalho (e diz que depois, quando eles crescem ainda mais é ainda pior, sim, já sei). Antes assim: prefiro estas reflexões sobre como educar, esta descoberta diária dele a descobrir o mundo, do que a loucura do "mas o que é que devo fazer" do início, do cansaço do início, do choro do início, das noites sem dormir do início (se é que se pode chamar início a mais de 12 meses). E o que mais quero é que ele me diga o que sente, em vez de fazer como eu fazia, que ficava triste em silêncio.
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